terça-feira, 19 de outubro de 2010

Morte e Chocolate

Primeiro, as cores.



Depois, os humanos.

Em geral, é assim que vejo as coisas.

Ou, pelo menos, é o que tento.

EIS UM PEQUENO FATO

Você vai morrer.


Com absoluta sinceridade, tento ser otimista a respeito de todo esse assunto, embora a maioria das pessoas sinta-se impedida de acreditar em mim, sejam quais forem meus protestos. Por favor, confie em mim. Decididamente, eu sei ser animada, sei ser amável. Agradável. Afável. E esses são apenas os As. Só não me peça para ser simpática. Simpatia não tem nada a ver comigo.

reação ao fato supracitado

Isso preocupa você?

Insisto — não tenha medo.

Sou tudo, menos injusta.

— É claro, uma apresentação.

Um começo.

Onde estão meus bons modos?

Eu poderia me apresentar apropriadamente, mas, na verdade, isso não é necessário. Você me conhecerá o suficiente e bem depressa, dependendo de uma gama diversificada de variáveis. Basta dizer que, em algum ponto do tempo, eu me erguerei sobre você, com toda a cordialidade possível. Sua alma estará em meus braços. Haverá uma cor pousada em meu ombro. E levarei você embora gentilmente.

Nesse momento, você estará deitado(a). (Raras vezes encontro pessoas de pé.) Estará solidificado(a) em seu corpo. Talvez haja uma descoberta; um grito pingará pelo ar. O único som que ouvirei depois disso será minha própria respiração, além do som do cheiro de meus passos.

A pergunta é: qual será a cor de tudo nesse momento em que eu chegar para buscar você? Que dirá o céu?

Pessoalmente, gosto do céu cor de chocolate. Chocolate escuro, bem escuro. As pessoas dizem que ele condiz comigo. Mas procuro gostar de todas as cores que vejo — o espectro inteiro. Um bilhão de sabores, mais ou menos, nenhum deles exatamente igual, e um céu para chupar devagarinho. Tira a contundência da tensão. Ajuda-me a relaxar.

Uma pequena teoria:

As pessoas só observam as cores do dia no começo e no fim, mas, para mim, está muito claro que o dia se funde através de uma multidão de matizes e entonações, a cada momento que passa. Uma só hora pode consistir em milhares de cores diferentes. Amarelos céreos, azuis borrifados de nuvens. Escuridões enevoadas. No meu ramo de atividade, faço questão de notá-los.

Já que aludi a ele, o único dom que me salva é a distração. Ela preserva minha sanidade. Ajuda-me a agüentar, considerando-se há quanto tempo venho executando este trabalho. O problema é: quem poderia me substituir? Quem tomaria meu lugar, enquanto eu tiro uma folga em seus destinos-padrão de férias, no estilo resort, seja ele tropical, seja da variedade estação de inverno? A resposta, é claro, é ninguém, o que me instigou a tomar uma decisão consciente e deliberada — fazer da distração minhas férias. Nem preciso dizer que tiro férias à prestação. Em cores.

Mesmo assim, é possível que você pergunte: por que é mesmo que ela precisa de férias? De que precisa se distrair?

O que me traz à minha colocação seguinte.

São os humanos que sobram.

Os sobreviventes.

É para eles que não suporto olhar, embora ainda falhe em muitas ocasiões. Procuro deliberadamente as cores para tirá-los da cabeça, mas, vez por outra, sou testemunha dos que ficam para trás, desintegrando-se no quebra-cabeça do reconhecimento, do desespero e da surpresa. Eles têm corações vazados. Têm pulmões esgotados.

O que, por sua vez, me traz ao assunto de que lhe estou falando esta noite, ou esta manhã, ou seja lá quais forem a hora e a cor. É a história de um desses sobreviventes perpétuos — uma especialista em ser deixada para trás.

É só uma pequena história, na verdade, sobre, entre outras coisas:

* Uma menina

* Algumas palavras

* Um acordeonista

* Uns alemães fanáticos

* Um lutador judeu

* E uma porção de roubos

Vi três vezes a menina que roubava livros.


A Menina que Roubava Livros - Markus Zusak

7 comentários:

  1. Eu amo demais esse livro. Li duas vezes. :) E a parte do começo então... essa sobre as cores e outra coisa que ela fala, sobre a aparência dela.
    "Os seres humanos me assombram".
    ;*

    ResponderExcluir
  2. É uma pena que eu ainda não li esse livro, sinto-me até ligeiramente envergonhada por dizer isso. Primeiro pq amo literatura em vários gêneros e segundo pq A menina que roubava livros parece ser um daqueles livros que nos deixa com lágrimas nos olhos, um pouco de tristeza, um pouco de felicidade e compreenção, mas muito mais pq atraves dessa narrativa em forma de poesia podemos compreender e enchergar certas coisas que não conseguimos normalmente.

    De todo modo A menina que roubava livros ja está na minha vasta lista de livros e quando eu lê-lo vou comentar aqui o que achei.

    Lindo o post Hoshi, adorei a dica ^^

    Bjo =*

    ResponderExcluir
  3. Eu simplesmente AMO esse livro!
    De maneira original e sensível, conta uma das histórias mais emocionantes que já li!
    Terminei esse livro em lágrimas ><

    Também recomendo *-*

    Ah, tem selo pra você lá no blog ;*

    ResponderExcluir
  4. Amo esse livro. Certamente um dos melhores que eu já li.


    Seguindo...

    ResponderExcluir
  5. Eu li esse livro. Nao me apaixonei por ele! --'

    Enfim, tem selo pra vc no meu blog.
    Fazia tempo que eu num vinha aqui.
    Vc lembra de mim? rs
    Beijos

    ResponderExcluir

Obrigada por dar a sua opinião :)